Futebol e Emoção



Todos concordam que o futebol é emoção. Entretanto, algumas figuras importantes devem estar nele sem emoção, pois, no estado emotivo, seriam parciais. Um juiz imparcial não deveria ter emoções ou deveria ter um alto ou, mesmo, um controle absoluto sobre elas. Por vezes, o mesmo argumento se aplica ao jornalista de quem demandamos imparcialidade que, geralmente, é entendida como informação sobre os diversos pontos de vista do evento em foco. No entanto, a suposta imparcialidade ou parcialidade do jornalista teria pouca influência direta na partida. No caso dos juízes de futebol esta conduta – imparcialidade e/ou parcialidade – teria, inexoravelmente, uma influência direta no resultado do jogo. 

Surge uma questão óbvia que deveria ser pesquisada: se o juiz de futebol é um amante do futebol, por que escolheu estar no jogo colocando de fora o que nele é fundamental: o emocionar-se, o torcer pela equipe amada? Se o futebol é emoção, dos dirigentes aos torcedores, como surge uma função cuja virtude principal, a imparcialidade, significa não ter emoções, ou ter um controle absoluto sobre elas? 

O modelo do juiz seria o famoso Sr. Spock do conhecido seriado Star Trek ? Os criadores do personagem teriam se inspirado no juiz de futebol? Será que os amantes do futebol aceitariam um juiz que declarasse que considera “o futebol um jogo monótono e entediante”, que ele pouco se importa quem ganhe ou perca, que está em campo somente para aplicar o regulamento, que  sua atuação não pode fazer o jogo chato, porque “ele é assim por essência” e que apita apenas para ganhar seu dinheiro? Nunca ouvimos um juiz com essas opiniões, embora ele talvez pudesse ser o emblema do juiz imparcial. Mas seria ele aceito para apitar um jogo? Aceitar-se-ia sua competência para avaliar o espírito do jogo? Parece que o juiz deve ser um dos de dentro, isto é, dos amantes ou engajados com o futebol e, ao mesmo tempo, deve julgar com a imparcialidade que poderia ser entendida como objetividade, distanciamento, “desengajamento”. 

Atribui-se à filosofia ou à epistemologia do positivismo a defesa desses  valores/atitudes no processo de conhecimento que estão relacionados com a equanimidade, à qual fizemos referência anteriormente. 

O fato é que se exige que o juiz colabore com a realização de um bom espetáculo futebolístico, que seja um bom regente do confronto, e a imparcialidade seria uma condição central da regência correta. A analogia com a regência, contudo, não é válida. Do regente da orquestra não se exige imparcialidade. Mais ainda, a boa regência da partitura se situa em outro eixo: o da criação ou interpretação original que não necessita ser imparcial, justa ou equânime. 

A regência pode ser valorizada ainda se traindo ou recriando o espírito convencionalmente aceito da obra. Teríamos, então, que procurar outra analogia: a do regente de orquestra não é adequada para o regente do jogo de futebol. Temos que reconhecer que há uma contradição entre o reconhecimento do lugar fundamental da emoção no futebol e o requerimento da imparcialidade ou não emoção do árbitro. 




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