O árbitro é tão importante que,
na transmissão dos jogos pela televisão, tornou-se frequente a presença de um árbitro
aposentado, geralmente com um passado de fama
“arbitral”, que julga
a conduta parcial
ou imparcial de
seus colegas em atividade em cada ato e sua regência de
conjunto.
Não teríamos como afirmar que sua
conduta é imparcial, pois, de praxe, ele julga os lances mais polêmicos a
partir de imagens de várias câmeras, que estão à sua disposição no set de televisão e de replays em câmara lenta.
Julgam os árbitros sem o clamor da torcida nem as pressões dos jogadores,
dentro do aquário físico das transmissões atuais. Ou seja, julgam em condições bem
diferentes da dos árbitros que
transpiram acompanhando os deslocamentos de jogadores e bola pelo
campo, que escutam o clamor das torcidas e
as exclamações dos
atletas.
Dizer que
o árbitro errou
ou não errou
a partir da parafernália da
tecnologia de reprodução
dos eventos significa
aceitar que as condições
de produção dos
sentidos não afetam
sua produção e,
o que é
pior, contribuir com a imagem de que os árbitros seriam dominantemente
imparciais ou errariam em suas atuações. Mesmo quando, na síntese final, se elogie sua atuação, será que isso
apaga os comentários feitos a partir da parafernália reprodutora do evento?
As discussões sobre a
imparcialidade apontam o conhecimento do árbitro das regras, sua
interpretação e aplicação,
sua movimentação em
campo e muitas suposições sobre o que o árbitro viu
ou deveria ter visto. Se um dos ingredientes do futebol é a polêmica desde a
escalação ao resultado, um dos temperos passou a ser a discussão
sobre o impacto
do árbitro sobre
o jogo e,
muito particularmente, a imparcialidade ou parcialidade do árbitro.
Como pano de fundo ou
lugar-comum, existe o reconhecimento geral de que há grandes dificuldades para
se realizar uma arbitragem correta do jogo de futebol.
A
complexidade do jogo,
o número de
jogadores e as regras,
sua velocidade crescente, o fato
de que a bola parece ter vida própria (bola na mão, por exemplo), e mais
algumas outras, fazem parte da complexidade.
Mais ainda, se reconhece que, no futebol
atual, o treino
e os esquemas
táticos levaram a
uma velocidade que talvez não existisse antigamente.
Mudanças na velocidade, sobretudo incrementos, afetam nossa
capacidade de julgar
aquilo que ocorre.
A frase banal
e sempre repetida “foi tudo tão rápido que é difícil dizer o que
ocorreu” testemunha o efeito da
velocidade sobre os
sentidos e o
intelecto; a velocidade
gera incerteza, perplexidade e
ignorância. A velocidade
e a complexidade
colocam em xeque
a epistemologia do ver, o olhar da testemunha, no jogo do futebol e,
como corolário, no agir imparcial do árbitro.
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